Biografia
Pedro Jerônimo era cearense de Aracatí, mudou-se muito cedo para Fortaleza e trabalhou como viajante-vendedor para laboratórios farmacêuticos e para outros segmentos comerciais. Ingressou no PCB nos anos 1940 e exerceu papel importante na reestruturação partidária, depois que o registro legal desse partido foi cassado em 1948. Integrou a direção municipal de Fortaleza e também fez parte do Comitê Estadual do Ceará. Após o Golpe de Estado de 1964, já atuando na clandestinidade, desempenhou as funções de tesoureiro durante vários anos. Também participou do Diretório Municipal do MDB em Fortaleza, durante o período em que os integrantes do PCB atuavam legalmente no único partido de oposição que o regime ditatorial consentia.
Em 11/09/1975, foi preso e levado para o DOI-CODI quando seguia de ônibus por um bairro da capital cearense. Um amigo que estava no mesmo ônibus comunicou o fato à família e, alguns dias depois, foi possível visitá-lo preso. No dia 17, entretanto, os familiares foram informados por agentes do DOPS que Pedro Jerônimo havia se suicidado dentro de sua cela. O legista Francisco Noronha Filho assinou o laudo indicando como causa da morte “asfixia mecânica por enforcamento”.
O corpo apresentava diversos hematomas que, segundo os policiais, se deviam à forma como Pedro cometeu o suicídio. Segundo explicavam cinicamente, por ter se enforcado com uma toalha de rosto amarrada em lugar de pouca altura, foi forçado a debater-se contra as paredes e o chão da cela para conseguir o seu intento. Seis meses depois, a família solicitou exumação do cadáver e o exame pericial constatou as diversas torturas sofridas, desmontando completamente a versão do suicídio. Vinte anos depois, um depoimento do advogado Pádua Barroso, prestado em 18/12/1995 à Comissão de Direitos Humanos da OAB do Ceará, voltou a desmascarar a explicação oficial. Pádua mostrou a autópsia realizada no corpo de Pedro, onde há registro de inúmeras fraturas ósseas, e informou ter acompanhado pessoalmente a exumação, “...realizada dentro de um cerco de guerra, tendo em vista que o cemitério Parque da Paz foi tomado por viaturas da PM e da PF; ...a razão da presença dos policiais no cemitério era amedrontar os peritos e os familiares bem como as demais pessoas que estavam interessadas no esclarecimento da morte de Pedro Jerônimo”.
O relator do processo de Pedro Jerônimo na CEMDP anexou ao seu voto declarações de um tenente coronel da PM do Ceará – cujo nome foi omitido para preserva-lo –, concedidas ao advogado Pádua Barros sobre a prisão e morte de Pedro Jerônimo de Sousa: “Tudo funcionou deste modo – o Chefe da 2ª Secção do QG da 10ª RM, tenente coronel Francisco Valdir Gomes, despachou o Pedido de Busca; a prisão foi efetuada por dois agentes policiais chefiados por um tal de Dr. Evandro, que se supõe tratar-se de oficial do Exército; feita a prisão, levaram Pedro Jerônimo para o Quartel de Guardas (DOI); aí o major Luís Marques de Barros mandou que levassem Pedro Jerônimo para a Casa de Hóspedes, no bairro de Mata Galinha... deram logo uma pancada no frontal de Pedro Jerônimo. Após uma série de sofrimentos foi sentado num banco, sem encosto, e um brutamonte deles se aproximou pelas costas, curvou um joelho encostando-lhe na coluna dorsal e tentou sufocá-lo com um instrumento escuro, puxando nas duas extremidades para trás... e quebrou o pescoço de Pedro Jerônimo. Arrepiados com o crime que cometeram, prepararam, em conluio com o DPF e o DOPS, o enforcamento suicida”.
O relator acrescentou que os depoimentos de Tarcisio Leitão de Carvalho, Alfredo de Abreu Pereira Marques e de Sarah Pinheiro Sousa (esposa de Pedro) prestados à Comissão de Direitos Humanos da OAB/Ceará, eram plenamente suficientes para atestar a participação de Pedro Jerônimo em atividades políticas de oposição, bem como o fato da prisão e as condições da morte. Além disso, o deputado Alfredo Marques, do MDB, denunciou da tribuna da Assembléia Legislativa de Pernambuco o tenente Horácio Marques Gondim como um dos responsáveis por mais esse assassinato.
Numa rápida síntese, assim Elio Gaspari abordou esse episódio no livro A Ditadura Encurralada: “No dia 17, o DOI do Ceará divulgou uma nota informando que o vendedor Pedro Jerônimo de Souza, militante do PCB e membro do diretório do MDB de Fortaleza, se suicidara na prisão. Tinha 61 anos. Era o 37º suicida do regime, o 17º a se enforcar. No caso, com uma toalha de rosto”.