Biografia
O caso de Paulo Torres Gonçalves, estudante secundarista carioca, funcionário do Ibope e aluno do curso científico do Colégio Profissional Ferreira Viana, Maracanã, Rio de Janeiro, teve dois processos na CEMDP, sendo o primeiro indeferido. Foram anexados documentos dos pais denunciando o desaparecimento do filho em 26 de março de 1969, aos 19 anos, e sua busca nos diversos órgãos públicos. Em seus relatos, informam que receberam de um sargento da Aeronáutica e de um capitão do Exército a notícia de que Paulo teria sido preso pelo DOPS e encaminhado à Marinha. Nada havendo contra ele, seria libertado em breve, o que não ocorreu.
Um detento da Ilha Grande enviou carta aos pais de Paulo contando que teria estado com ele, no Presídio Tiradentes, em São Paulo (SP), encontrando-se o jovem completamente desmemoriado. O relato foi confirmado na presença do casal e do chefe da segurança da Ilha Grande. Em 1971, a família recebeu a notícia de que o estudante apareceu morto, vítima de afogamento. O cadáver, contudo, não correspondia a ele. As informações da época, em atendimento aos pedidos de localização, indicavam que Paulo Torres não registrava antecedentes nos órgãos de segurança.
O segundo relator desse processo fez inúmeras diligências buscando novas informações. Em seu voto, reafirmou o extremo valor da peregrinação da família de Paulo, desde o dia do seu desaparecimento, e informou que a Comissão Especial estava tentando localizar as pessoas referidas por ela, sem sucesso, acrescentando que a “União teve 37 anos para fazê-lo e nada realizou nesse sentido. E, se o fez, não informou a CEMDP”.
Concluiu que restava tão somente aplicar a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos ao caso para responsabilizar o Estado: “Em certas circunstâncias pode ser difícil a investigação de fatos que atentem contra os direitos das pessoas. A de investigar é, junto com a de prevenir, uma obrigação de meio ou de comportamento que não é descumprida somente com o fato de que a investigação produza um resultado satisfatório. Entretanto, deve empreender-se com seriedade e não como uma simples formalidade condenada de antemão a ser inútil. Deve ter sentido e ser assumida pelo Estado como um dever jurídico próprio e não como uma simples gestão de interesses particulares, que dependa da iniciativa processual da vítima ou de seus familiares ou da contribuição particular de elementos probatórios sem que a autoridade pública busque efetivamente a verdade. Esta avaliação é validada qualquer que seja o agente ao qual se possa efetivamente ser atribuída a violação, ainda os particulares, pois, se seus fatos não são investigados com seriedade, resultariam, de certo modo, auxiliados pelo poder público, comprometendo a responsabilidade internacional do Estado “. (Caso Velásquez Rodriguez).
Belisário dos Santos Júnior reconheceu que não havia uma indicação precisa da militância política de Paulo, porém lembrou que a acusação de participação política a quem não a tenha igualmente enseja o reconhecimento de desaparecimento. Segundo o relator, as circunstâncias do caso davam a entender – e as próprias autoridades assim o reconheceram em suas buscas – que a prisão pelas forças de repressão teria como causa principal, ou pretexto, a subversão. Dessa forma, entendeu que estavam presentes no caso as condições para deferimento do pedido.