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ACERVO - MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS

Ficha descritiva: ONOFRE PINTO
 

Nome: ONOFRE PINTO

Pai: Júlio do Rosário

Mãe: Maria Pinto do Rosário

Idade quando desaparecido:

Dôssie
...
Procedimento administrativo CEMDP
139/96
Nome
ONOFRE PINTO
Data de Nascimento
26/01/1937
Municipio de Nascimento
Jacupiranga (SP)
Status
Desaparecido
Biografia

 

A morte de seis integrantes da VPR, em 13/07/1974 sendo eles DANIEL JOSÉ DE CARVALHO ENRIQUE ERNESTO RUGGIA JOEL JOSÉ DE CARVALHO JOSÉ LAVECCHIA ONOFRE PINTO E VITOR CARLOS RAMOS, constitui um dos episódios mais recobertos de incertezas e mistério, até hoje, entre todos os casos de mortes e desaparecimentos registrados no período ditatorial. Essa organização clandestina praticamente já não existia mais no Brasil, tendo sido desmobilizada no início de 1973.

 

Decididos a retornar do exílio para combater o regime militar, esses militantes entraram clandestinamente no território nacional, pela região de Foz do Iguaçu, em julho de 1974. Quatro deles tinham sido banidos entre 1969 e 1971: Onofre, Lavecchia, Daniel e Joel. Foram atraídos para uma cilada e executados no município de Medianeira (PR), no interior da mata do Parque Nacional do Iguaçu.

 

Os nomes de Lavecchia, Onofre, Joel, Daniel e Ernesto integram a lista de desaparecidos políticos anexa à Lei nº 9.140/95. O caso de Vitor somente foi conhecido depois da edição da Lei, sendo analisado e deferido pela CEMDP.

 

Militantes que conviveram com Onofre Pinto após o Massacre da Chácara São Bento, em janeiro de 1973, quando foram mortos seis militantes da VPR em Pernambuco, relataram que esse exilado expressava desespero e inconformismo pela confiança que tinha depositado no agente infiltrado cabo Anselmo. Onofre era o dirigente principal da VPR, fora alertado sobre a infiltração de Anselmo, mas não aceitara as evidências.

 

A partir daquele episódio, passou a viver obcecado pela idéia de retornar à luta clandestina no Brasil. No entanto, é provável que tenha incorrido uma segunda vez no mesmo erro fatal, confiando em um ex-sargento da Brigada Militar gaúcha, ligado a Leonel Brizola, Alberi Vieira dos Santos, que parece ter sido um outro agente infiltrado, que atraiu esse grupo para a morte, conforme informações divulgadas quase 20 anos depois.

 

A data da viagem para o Brasil somente foi estabelecida através de informação fornecida por Idalina, mulher de Onofre. As informações acerca do ocorrido com o grupo tiveram novos elementos a partir de 1992, quando foi revelada a atuação do casal Maria Madalena Lacerda de Azevedo e Gilberto Giovanetti, que confessaram terem sido cooptados pelos órgãos de repressão, passando a realizar missões policiais, inclusive no exterior. Giovanetti tinha sido companheiro de Daniel e Joel na Ala Vermelha de São Paulo, tendo participado, segundo documentos dos órgãos de segurança, de assalto a um carro forte, em 14/04/1969, em que dois guardas foram mortos.

 

Madalena e Gilberto afirmam que foram presos num encontro que teriam com Alberi, no dia 13/07/1974, em Curitiba. Já desempenhando a nova posição de agente infiltrado, Madalena viajou para Buenos Aires e avisou a Idalina que o marido estava morto.

 

As condições em que foram executados esses seis militantes também foram descritas, em 1993, pelo ex-sargento Marival Chaves Dias do Canto, que atuou no DOI-CODI/SP. Ele confirmou que a operação de Medianeira foi montada por Alberi, mas acrescenta entre os mortos o nome de Gilberto Faria Lima, conhecido como Zorro, militante da REDE que esteve na área de treinamento da VPR no Vale do Ribeira, em 1970. Seu nome nunca constou da lista de mortos e desaparecidos e não há certeza de que tenha efetivamente integrado o grupo, sendo que seus familiares não apresentaram requerimento à CEMDP.

 

O nome de Alberi, até então considerado um herói pelos seus companheiros sobreviventes, constava do Dossiê dos Mortos e Desaparecidos. Ele tinha sido o braço direito do coronel Jefferson Cardin de Alencar Osório na chamada Guerrilha de Três Passos, em março de 1965. Teria sido condenado pela Justiça Militar e cumprira pena de 8 anos. Cinco anos depois, ele próprio seria encontrado morto, em 10/01/1979, na região de Foz do Iguaçu, quando investigava a morte de seu irmão, José Soares dos Santos, ocorrida em janeiro de 1977. Outro dos irmãos de Alberi, Silvano, morreu em 1970, após ter cumprido pena pela participação no movimento de Jefferson Cardin. As condições de sua morte ainda não foram esclarecidas e o pedido de seus familiares à CEMDP terminou sendo indeferido.

 

Alguns dos refugiados políticos procurados por Alberi, que convidava para retornar ao Brasil e implantar uma base guerrilheira no sudoeste do Paraná, levantavam suspeitas sobre sua atuação e sobreviveram por não aceitar o insistente convite.

 

Algumas luzes sobre esse misterioso episódio só começaram a surgir em 2005, quando Aluízio Palmar lançou o livro “Onde foi que vocês enterraram nossos mortos?”, reconstituindo, ao final de quase três décadas de investigação, os últimos passos dos seis guerrilheiros.

 

Aluízio, jornalista que militou no primeiro MR-8 e na VPR, esteve preso no Paraná e foi banido do Brasil no seqüestro do embaixador suíço, em 1971. Ele foi um dos convidados por Alberi para retornar. Ao declinar do convite e sobreviver, dedicou-se exaustivamente a descobrir o destino dos companheiros. Morador de Foz do Iguaçu após seu retorno ao Brasil, recebeu em 2001 informações sobre um possível local de sepultamento dos guerrilheiros, o que levou a CEMDP a organizar uma busca em Nova Aurora, no Oeste do Paraná, a cargo dos técnicos da Equipe Argentina de Antropologia Forense.

 

Aluízio Palmar conseguiu descobrir o agente policial que trabalhou junto com Alberi e que participou diretamente dessa operação de infiltração. Desempenhando o papel de motorista e usando o nome fictício de Otávio Camargo, esse agente foi encarregado de buscar o grupo que saíra de Buenos Aires no dia 11 de julho, levando-o para o sítio de Niquinho Leite, parente de Alberi que não tinha conhecimento do que iria suceder. Pelo contrário, segundo revela Aluízio, Niquinho achava que estava contribuindo com os Revolucionários. O sítio fica em Boa Vista do Capanema, onde o grupo chegou no dia 12 de julho.

 

Alberi tinha convencido o grupo de que a melhor entrada para o Brasil seria uma base de apoio em Santo Antônio do Sudoeste (PR). Chegando ao sítio, os viajantes descansaram da viagem de mais de 24 horas. Longe de ser uma base de apoio, o local e o plano eram uma armadilha para eliminar o grupo. “O sítio não era da VPR; Niquinho era um inocente útil usado pelo sobrinho (Alberi); Otávio, um membro do Centro de Inteligência do Exército; e Alberi, o cachorro que estava levando-os para uma armadilha... Durante a viagem, desde que saíram de Buenos Aires, os exilados foram monitorados por agentes do CIE (Centro de Informações do Exército)”.

 

Prossegue Aluízio Palmar em seu livro:

 

“A Operação Juriti estava em marcha, comandada pelo ‘doutor César’ (coronel José Brandt Teixeira) e pelo ‘doutor Pablo’ (coronel Paulo Malhães). Ela havia começado no Chile, teve sua continuidade na Argentina e agora chegava à sua fase final. Durante a viagem pela Argentina, desde que saíram de Buenos Aires, os exilados foram monitorados por agentes do CIE. Marival Chaves foi um deles. Toda a operação foi controlada à distância pelos coronéis Brandt e Malhães. Os agentes fizeram rodízio e acompanharam o retorno dos Revolucionários até chegarem ao sítio de Niquinho. Para cumprir a ordem de extermínio, um grupo comandado pelo cão de guerra major Sebastião Rodrigues Curió, que usava o pseudônimo de doutor Marco Antonio Luchinni, iria esperar no Caminho do Colono, seis quilômetros mato a dentro do Parque Nacional do Iguaçu. Aquela noite e o dia seguinte eles passaram no sítio. Enquanto uns descansavam, outros foram andar pelo mato ou pescar no Rio Capanema. Ao anoitecer do dia 13, Alberi e Otávio saíram com Joel, Daniel, Victor, Lavecchia e Enrique para executar a primeira ação revolucionária, uma expropriação na agência do Banco do Estado do Paraná, em Medianeira”.

 

Segundo o relato do agente Otávio, o plano era levar o grupo para um assalto a uma agência bancária. Onofre não participaria por ser muito conhecido. E prossegue o relato de Aluízio:

 

“Otávio deu a partida no motor e o carro subiu a lomba, para em seguida seguir pela estreita e sinuosa Estrada do Colono. Com exceção de alguns raios de luz que, de vez em quando, cruzavam a mata fechada, a escuridão era total. Depois de rodar quase seis quilômetros, a rural fez uma curva fechada e entrou num picadão à direita, que dava acesso a uma clareira. ‘Chegamos companheiros’, disse Alberi enquanto descia do veículo. O grupo caminhou um pouco e, de repente, antes de chegar à clareira, fez-se no meio do mato um clarão e fuzilaria abundante. Otávio ficou junto ao carro, Alberi correu e se jogou no solo, Lavecchia deu um tiro a esmo antes de cair. Após o tiroteio, a floresta foi tomada pelo silêncio, apenas interrompido pelo barulho dos coturnos dos militares do grupo de extermínio que saíam de seus esconderijos para fazer um balanço da chacina. (...) No chão, entre folhas e entrelaçado por cipós, o jovem Enrique Ernesto Ruggia ainda estava vivo e, tal como o Che, teimava em perseguir seu sonho de libertar a América Latina do domínio norte-americano e implantar o socialismo. (...) A ordem era matar e uma descarga final de pistola tirou o último sopro de vida de Enrique Ruggia”.

 

O pelotão de fuzilamento limpou a área, enterrando os corpos numa cova ali mesmo. Onofre foi executado depois, e seu corpo teria sido jogado em um rio. ‘Otávio Camargo’ não quis falar com Aluízio, mas recebeu o agente da Polícia Federal Adão Almeida e foi até o local onde estariam os corpos. Em maio de 2005, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República procedeu à busca com os técnicos da Equipe Argentina de Antropologia Forense, mas não foi possível encontrar a cova.

 

Onofre Pinto era paulista de Jacupiranga, afrodescendente, e tinha liderado, em São Paulo, as mobilizações do Clube de Subtenentes e Sargentos do Exército no período anterior a abril de 1964. Era formado em contabilidade e casado com Idalina Maria Pinto, com quem teve uma filha, Kátia Elisa. Teve seus direitos políticos cassados pelo primeiro Ato Institucional, em abril de 1964, e sua prisão preventiva foi decretada em 8 de outubro do mesmo ano, por sua participação no “Movimento dos Sargentos”. Foi um dos fundadores e líderes principais da VPR.

 

Tinha sido preso anteriormente, em 02/03/1969, por agentes do DOPS e da 2ª Companhia da Polícia do Exército. Era acusado pelos órgãos de segurança do regime militar de participação em inúmeras ações armadas que resultaram em mortes, inclusive no atentado a bomba contra o Quartel general do II Exército, no Ibirapuera, em 26/06/1969, quando morreu o soldado Mário Kozel Filho. Foi banido do Brasil em setembro de 1969, quando do seqüestro do embaixador americano no País, e viajou para o México com outros 14 presos políticos. Dali seguiu para Cuba, onde teria recrutado para a VPR exilados como o cabo Anselmo, Aluizio Palhano, Edson Quaresma e outros. Morou ainda no Chile e na Argentina.

 

O Dossiê dos Mortos e Desaparecidos transcreve um registro policial encontrado nos arquivos secretos do DOPS/SP a seu respeito: “Informação do II Exército de 29/01/70, esclarece que Onofre Pinto... teria a intenção de retornar ao Brasil... em princípios de fevereiro de 1970”. E completa os dados: “O Ministério do Exército nos cientificou que provavelmente o marginado encontrar-se-ia no Chile”.

 

Outras informações ratificam que ele se encontrava sob estrita vigilância: “A CIOP, em 2/7/73, nos cientificou do seguinte: ‘A carteira de identidade de Francisco Wilton Fernandes, emitida pelo Instituto Nacional de Identificação do Departamento de Polícia Federal, Brasília, em 17/05/73, RG n° 104.947, estaria de posse de um aparelho de subversivos brasileiros em Santiago do Chile. Segundo o informante, a referida carteira deverá ter a fotografia substituída pela de Onofre Pinto”. “Relatório de Plantão de 29/6/74 nos cientifica que através do Rádio n° 3749, proveniente da DPF, fomos solicitados a observar os indivíduos Onofre Pinto e Daniel José de Carvalho, que se dirigem para São Paulo, procedentes do Uruguai”. Num desses registros policiais aparece, inclusive, a informação de que o grupo se dirigia ao Brasil com a intenção de justiçar o delegado Sérgio Paranhos Fleury.

 

Local de morte/desaparecimento
Foz do Iguaçu (PR)
Organização política ou atividade
VPR
Data do Recolhimento da documentação física para o Arquivo Nacional
06/08/2009
Resultado do julgamento
Lei nº 9.140/95 – 04/12/95
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