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ACERVO - MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS

Ficha descritiva: JOSÉ ROBERTO ARANTES DE ALMEIDA
 
JOSÉ ROBERTO ARANTES DE ALMEIDA

Nome: JOSÉ ROBERTO ARANTES DE ALMEIDA

Pai: José Arantes de Almeida

Mãe: Aída Martoni de Almeida

Idade quando desaparecido: 28 anos

Dôssie
...
Procedimento administrativo CEMDP
271/96
Nome
JOSÉ ROBERTO ARANTES DE ALMEIDA
Data de Nascimento
07/02/1943
Municipio de Nascimento
Pirajuí (SP)
Status
Morto
Biografia
 
Arantes e Aylton Adalberto Mortati foram presos no dia 04/11/1971, na Rua Cervantes, número 7, bairro de Vila Prudente, na capital paulista, por agentes do DOI-CODI/SP. Foram os dois primeiros militantes mortos, de um grupo de 28 exilados que participaram de treinamento de guerrilha em Cuba e retornaram clandestinamente ao Brasil como integrantes do MOLIPO, dissidência da ALN. A prisão de Aylton nunca foi assumida pelos órgãos de segurança e seu nome integra a lista de desaparecidos políticos anexa à Lei nº 9.140/95.

Aylton nasceu em Catanduva, interior de São Paulo, em 13/01/1946. Fez o primário, o ginasial e o colegial em sua cidade natal. Depois foi cursar Direito em São Paulo, no Mackenzie, onde recebeu o apelido de “Tenente” por assistir às aulas com a farda de aluno do CPOR – Centro de Preparação de Oficiais da Reserva. Engajou-se no Movimento Estudantil e teve atuação destacada até ser preso no 30º Congresso da UNE, em 1968. Era excelente pianista e faixa preta de caratê. Depois dessa primeira prisão, ingressou na ALN e viajou para Cuba em 1970.

Seu codinome era Umberto, em homenagem ao próprio pai, mas todos o conheciam por “Tenente”. Nessa época, sua carta patente de oficial da reserva foi cassada pelo presidente Emílio Garrastazu Médici.

Arantes nasceu em Pirajuí, no interior paulista, mas era ainda criança quando sua família se mudou, em 1956, para Araraquara (SP), onde seu pai assumiu o posto de professor de Botânica na Faculdade de Farmácia e Odontologia. Foi escoteiro, tocou piano, praticou natação e pólo aquático, colecionando medalhas esportivas. Estudou no IEBA – Instituto de Ensino Bento de Abreu, daquela cidade. Em 1958, foi porta-bandeira de um desfile patrocinado pelo Clube Pan-Americano de Araraquara carregando o pavilhão nacional de Cuba, o que pode ter sido uma premonição, na medida em que nem Cuba e nem José Arantes eram socialistas ainda.

Em 1961, foi aprovado no disputado vestibular para Engenharia no ITA - Instituto Tecnológico da Aeronáutica. Em 1964, em virtude de suas atividades políticas, foi expulso do ITA e levado preso para a Base Aérea do Guarujá. Libertado, retomou os estudos na Faculdade de Filosofia da USP, onde iniciou o curso de Física. Em 1966, foi eleito presidente do Grêmio da Filosofia. Em 1967, tornou-se vice-presidente da UNE.

Em 1968, preso na repressão ao 30º Congresso da entidade, em Ibiúna (SP), Zé Arantes, como era conhecido, conseguiu fugir de dentro do DOPS, pela porta da frente, disfarçando-se no meio da balburdia produzida por quase 800 estudantes que lotavam as dependências daquela repartição no largo general Osório, em São Paulo.

Era companheiro de Aurora Maria Nascimento Furtado, liderança estudantil na Psicologia da USP, conhecida pelo apelido Lola, que seria torturada até a morte em 1972, como integrante da ALN. Arantes iniciou sua militância partidária no PCB, tornando-se, já em 1967, uma das principais lideranças da DISP – Dissidência Comunista de São Paulo, cujos quadros, a partir de 1969, se integrariam em boa parcela à ALN. Antes da montagem de seu processo para exame na CEMDP, a única informação disponível era a de que fora fuzilado pelos agentes do DOI-CODI.

A mãe de Aylton, Carmem Mortati, viveu os anos de 1970 e 1971 sob constante pesadelo:
“Minha vida e de minha família passou a ser de constante vigilância e provocação por parte de agentes de segurança, que estacionavam carros à frente de minha residência, subiam no telhado da casa, usavam o banheiro existente no fundo do quintal, revistavam compras de super-mercado, censuravam o telefone, espancaram meus sobrinhos menores e, ao que pude deduzir, provocaram um início de incêndio em minha residência/pensionato. Os agentes que vigiavam minha residência e meus passos por duas vezes atentaram contra minha vida, jogando o carro em minha direção. Nestas oportunidades escudei-me atrás do poste. A partir de então recebi, com constância e permanência, bilhetes ameaçadores, onde estava escrito que meu filho ia morrer e vinha junto o desenho de uma cruz, em preto, nos bilhetes. Quando eu recebia esses bilhetes ameaçadores, os levava de imediato ao Comando da Aeronáutica e os entregava a um capitão, que me havia interrogado anteriormente e que, de tanto eu levar-lhe bilhetes, resolveu me fornecer uma carta onde se consignava que a Aeronáutica tinha feito uma vistoria em minha residência e que eu não tinha nada a ver com as atividades de meu filho”.

Carmen Mortati contratou o advogado Virgílio Lopes Eney para procurar e defender Aylton. Certo dia, o advogado viu sobre uma mesa na 2ª Auditoria do Exército, em São Paulo, uma certidão de óbito em nome de Aylton Adalberto Mortati. Por tentar ler o documento, foi preso e levado para o DOI-CODI do II Exército, onde os militares o interrogaram e tentaram convencê-lo de que seu cliente nunca havia sido preso.

Em 1975, os presos políticos de São Paulo enviaram documento ao presidente do Conselho Federal da OAB, Caio Mário da Silva Pereira, denunciando a prisão, tortura e morte de Aylton, dentre outros casos. Nenhuma informação oficial sobre sua prisão foi divulgada.

No Arquivo do DOPS do Estado do Paraná foi encontrada uma gaveta com a identificação “falecidos”, onde constava o nome de Aylton. O Relatório do Ministério da Aeronáutica, de 1993, confirma sua morte nos seguintes termos telegráficos: “neste órgão consta que foi morto em 04/11/1971, quando foi estourado um aparelho na rua Cervantes, nº 7, em São Paulo. Na ocasião usava um passaporte, em nome de Eduardo Janot Pacheco”.

A morte de Arantes foi divulgada apenas no dia 09/11/1971. A família só foi informada quando ele já estava enterrado como indigente no Cemitério Dom Bosco, em Perus, com o nome falso de José Carlos Pires de Andrade. Graças à intervenção de um delegado do DOPS, Emiliano Cardoso de Mello, parente da família de Arantes e pai da ex-ministra da Fazenda Zélia Cardoso de Mello, o DOPS autorizou o traslado do corpo para o Cemitério Municipal de Araraquara, em 12/11/1971.

A falsidade da versão oficial só foi comprovada com o exame dos documentos encontrados, a partir de pesquisa feita por Iara Xavier Pereira, assessora da CEMDP, no IML de São Paulo, bem como da análise da foto do cadáver,  localizada nos arquivos secretos do DOPS/SP. Na requisição da necropsia, datada de 04/11/1971, às 18h, encontra-se: “por volta das 17 horas, manteve tiroteio com membros dos órgãos de segurança, sendo nessa oportunidade ferido, e em conseqüência veio a falecer”. O corpo, entretanto, só chegou ao IML no dia 05/11/1971 às 18 horas, ou seja, 24 horas depois do suposto tiroteio onde fora morto. E mais, o laudo registra que a autopsia foi realizada às 15 horas do dia 05/11/1971. Portanto, antes de chegar ao IML.

Mas foi o laudo de necropsia, assinado por Luiz Alves Ferreira e Vasco Elias Rossi, que trouxe a informação  definitiva para elucidar o que realmente se passara: “segundo consta, trata-se de elemento terrorista, que faleceu em tiroteio travado ao resistir à prisão, com militares da OBAN, vindo a falecer às 17h30, aproximadamente, no dia 04/11/1971, sendo encontrado no pátio do trigésimo sexto distrito policial”. Como a 36ª DP, na Rua Tutóia, era sabidamente a sede do DOI-CODI de São Paulo, não restou dúvidas para os integrantes da CEMDP: se Arantes só fora recolhido no pátio da delegacia, 24 horas depois do suposto tiroteio, provavelmente chegou vivo àquela unidade.

Outras provas reforçaram a falsidade da versão oficial. A foto de Arantes morto, encontrada nos arquivos do DOPS/SP, contradiz frontalmente o laudo do IML. Enquanto o laudo afirma que o corpo tinha dois ferimentos pérfuro-contusos, de formato ovular, medindo três centímetros na maior dimensão, localizados na parte média da região frontal, a foto não mostra esses dois ferimentos a bala, e sim grandes equimoses na região esquerda, sinais evidentes de tortura. Focaliza também a camisa encharcada de sangue do lado esquerdo do tórax, enquanto o laudo não se refere a qualquer ferimento na região.

O relator do processo na Comissão Especial ponderou que “Arantes já fora preso na Base Aérea de Santos e em Ibiúna, em 1968. Os órgãos repressivos sabiam de suas ligações com a ALN e o Molipo e, no entanto, foi enterrado com nome falso, como indigente. A ocultação do cadáver visava, sem sombra de dúvidas, encobrir as torturas visíveis na foto e a execução com ferimentos não descritos no laudo”. Informações reunidas pelos familiares de Aylton dão conta de que ele permaneceu por cerca de 15 dias no DOI-CODI/SP, desaparecendo desde então. Em 1978, os estudantes da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara decidiram homenagear a memória de Arantes conferindo seu nome
ao Diretório Acadêmico daquela unidade da Unesp.
Local de morte/desaparecimento
São Paulo (SP)
Organização política ou atividade
MOLIPO
Data do Recolhimento da documentação física para o Arquivo Nacional
06/08/2009
Data da publicação no DOU
25/04/1996
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