Biografia
Heleny e Paulo de Tarso foram presos por agentes do DOI-CODI/RJ no dia 12/07/1971, no Rio de Janeiro. Seus nomes integram a lista dos desaparecidos políticos anexa à Lei nº 9.140/95. Ela já havia sido presa em março de 1970, sendo solta em abril do ano seguinte, ou seja, três meses antes de ser presa pela segunda vez.
Paulista de Bebedouro, Heleny foi casada com Ulisses Telles Guariba, professor de História na USP, de quem tinha sido colega na Faculdade de Filosofia daquela universidade. Tiveram dois filhos. Ela se especializou em cultura grega, trabalhou em teatro e deu aulas na Escola de Arte Dramática de São Paulo – EAD.
Em 1965, tinha recebido bolsa de estudos do Consulado da França em São Paulo, especializando-se na Europa até 1967. Fez inúmeros cursos, inclusive em Berlim, onde estudou Brecht e estagiou como assistente de direção. Ao voltar ao Brasil, foi contratada pela Prefeitura de Santo André para dirigir o grupo de teatro da cidade. Ali desenvolveu inúmeros trabalhos culturais, montando uma peça de Molière com os alunos das escolas municipais. Com o AI-5, seu trabalho foi interrompido, tendo ingressado na Aliança Francesa, em São Paulo, onde também montou e dirigiu peça de teatro, em francês.
Em março de 1970, foi presa pela primeira vez, em Poços de Caldas (MG), por militância na VPR, sendo torturada na Operação Bandeirantes (DOI-CODI/SP) pelos capitães Albernaz e Homero. Ficou internada no Hospital Militar durante dois dias, em função de hemorragia provocada pelos espancamentos. Foi transferida para o DOPS/SP e, depois, para o Presídio Tiradentes, sendo assistida pelo advogado José Carlos Dias, que seria mais tarde presidente da Comissão Justiça e Paz de São Paulo e, posteriormente, ministro da Justiça. Solta em abril de 1971, preparava-se para deixar o país. Os familiares e advogados fizeram buscas persistentes por todos os órgãos de segurança. Um brigadeiro chegou a confidenciar a uma amiga de parentes de Heleny ter visto o nome dela numa lista de presos da Aeronáutica.
Goiano de Morrinhos, Paulo de Tarso estudou no colégio Universitário da Universidade Federal de Goiás, onde concluiu o curso de Humanidades em 1962 e foi escolhido orador da turma. Ingressou na UnB, na Faculdade de Direito, onde se formou, em 1967, aos 23 anos. Foi presidente da Federação dos Estudantes Universitários de Brasília – FEUB. Inscrito na OAB, exerceu advocacia em Goiânia (GO), chegando a fazer sustentação oral em processo no STF. Em outubro de 1968, viajou para a França e fez curso de pós-graduação na Sorbonne. Companheiros de militância política na ALN informaram que, após a morte de Joaquim Câmara Ferreira, ele era um dos principais dirigentes da organização, utilizava o nome-de-guerra “Vovô” e tinha recebido treinamento militar em Cuba.
Seu pai, Pedro Celestino, advogado e deputado federal pelo estado de Goiás, foi cassado pelo AI-5, em 13 de dezembro de 1968. Usou de todos os meios ao seu alcance para descobrir o paradeiro do filho. Em dezembro de 1971, como resposta à solicitação da OAB, seccional de Brasília, o Ministério do Exército chegou a informar que Paulo de Tarso fora preso por autoridades militares, mas que havia sido entregue à Polícia Federal, devendo o Ministério da Justiça prestar informações. Tempos depois, o Ministério do Exército desmentiu o fato, alegando erro.
Em 20/02/1975, o então ministro da Justiça Armando Falcão fez um pronunciamento em rede de televisão para falar sobre 27 desaparecidos políticos, estando dentre esses o nome de Paulo de Tarso. Na versão do ministro, estavam todos foragidos. Em resposta, Pedro Celestino redigiu carta pública a Armando Falcão, que foi publicada no Jornal do Brasil em 21/02/1975 e em outros jornais do país. No ano anterior já tinha enviado ao general Golbery, homem forte do Governo Geisel, apelando: “Como cidadão e chefe de família é que dirijo-me a Vossa Excelência, rogando fazer chegar ao presidente da República o meu apelo extremo, depois de ver frustrados todos os recursos judiciais e extra judiciais permitidos pela ordem jurídica vigente no país (...) para encontrar meu filho. Não venho pedir-lhe que o solte, mas o mínimo que se deve garantir à pessoa humana, isto é, seja processado oficialmente, com o direito de sua família dar-lhe assistência jurídica e principalmente humana”.
Apesar do silêncio e da negativa sistemática das autoridades, as provas acerca da prisão e desaparecimento dos dois militantes foram sendo coletadas. Inês Etienne Romeu, em seu relatório de prisão, testemunhou que, durante o período em que esteve seqüestrada no sítio clandestino em Petrópolis (RJ), conhecido como “Casa da Morte”, dentre outros desaparecidos ali estiveram, no mês de julho de 1971, Walter Ribeiro Novaes, Paulo de Tarso e uma moça, que acredita ser Heleny. Na casa clandestina em Petrópolis, Heleny foi torturada durante três dias, inclusive com choques elétricos na vagina. Paulo de Tarso foi torturado durante 48 horas pelos carcereiros conhecidos por Inês como “Dr. Roberto”, “Laecato”, “Dr. Guilherme”, “Dr. Teixeira”, “Zé Gomes” e “Camarão”. Colocaram-no no pau-de-arara, deram-lhe choques elétricos e o obrigaram a ingerir grande quantidade de sal. Durante muitas horas Inês ouviu-o suplicando por um pouco de água.
Em 08/04/1987, a revista IstoÉ, na reportagem Longe do Ponto Final, publicou declarações do ex-médico, então lotado no DOICODI/RJ, Amílcar Lobo, que reconheceu ter atendido Paulo de Tarso quando estava preso nas dependências do DOI-CODI/RJ, sem, noentanto, precisar a data.